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O corpo platônico

Na alegoria descrita nas seções 514-517b do diálogo A República, de Platão, temos o quadro de uma alma figurada como um grupo de prisioneiros e o corpo como a prisão subterrânea em forma de caverna. Considerando que Platão é um filósofo que dialoga com a tradição órfica e pitagórica, o fato de que uma parte dessa alma tem a capacidade de se libertar desse corpo e de voltar insinua haver, pelo menos, três variantes de pessoas que se identificam com a parte da alma liberta: (a) a pessoa órfica que, movida pelo amor compassivo, retorna a um corpo humano para resgatar a parte da alma aprisionada nos ínferos do corpo, como Orfeu em relação a Eurídice; (b) a pessoa metempsicótica que, movida pelo amor à proporção matemática, retorna a um corpo ajustado a sua alma, como teria ocorrido a um amigo de Pitágoras, em relação a um corpo de cão e; (c) a pessoa filosófica que, movida pelo amor ao mundo das ideias, escolhe não retornar para corpo algum, como o Sócrates do Fédon. Nos três casos, a educação do corpo tem como valor fundamental a criação e a manutenção de aberturas por onde as luzes passam e as partes da alma possam fluir livremente. Em outra alegoria, conhecida como a parábola da biga dos cavalos alados, apresentada nas seções 246a-254e do Fedro, a parte livre da alma, no interior do corpo, é a pessoa do filósofo-rei figurada como guia de dois cavalos: um obediente, como o coração corajoso da classe dos guardiães da república; outro desobediente, como o baixo ventre concupiscível da classe dos mercadores da república. Aqui, o corpo, assim como a alma que o habita, é um estado tripartido cuja educação teleológica dirige-se à luz e tem como meta a ascensão de todas as pessoas na medida em que essas podem ser conduzidas pelo intelecto.

Referência(s):
COSTA, Israel Alexandria. Platão e a relação corpo/alma: material de aula. Arapiraca, AL: Grupo de Pesquisa Gnosiologia, Ética e Informação / CNPq / Ufal - Projeto Web Filosofia, 2021. Disponível em: https://www.gpgeinfo.org/p/pltcrp.html. Acesso em: 4 abr. 2021.
DIÁLOGOS: os gregos e a invenção da alma. Gabriele Corneli. [Entrevista cedida a] Henrique Froés. Brasília: UnBTV, 2017. 1 vídeo (ca. 21 min), color., pt., s/leg. son. Disponível em: https://youtu.be/N-EZ-5LO5Lo. Acesso em: 17 jun. 2020.
PLATÃO. A República. Tradução Maria Helena da Rocha Pereira. 9. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
PLATÃO. Fédon. Tradução José Cavalcante de Souza, Jorge Paleikat e João Cruz Costa. 5. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.
PLATÃO. Fedro ou Da Beleza. Tradução Pinharanda Gomes. 6. ed. Lisboa: Guimarães Editores, 2000.

Exercício(s):
a) 405/pl/plt_crp_alm